O papel da liderança inclusiva contra o “silêncio rosa”
O primeiro sinal de uma exclusão está em algo ensurdecedor: o silêncio. Não porque faltam palavras, mas porque muitas delas vêm acompanhadas […]
O primeiro sinal de uma exclusão está em algo ensurdecedor: o silêncio. Não porque faltam palavras, mas porque muitas delas vêm acompanhadas da falta de informação, do preconceito, da reprodução daquilo que crescemos aprendendo como “o normal”. Até mesmo, após a pandemia, quando a gente deu de cara com “o novo normal”, nele ainda não parecia caber (apesar dos avanços) o diferente, o diverso, o que precede a inovação. Um silêncio que tem cor, assim como o famoso “pink money”, e está refletida em um prisma de desafios e questões. A primeira dela, a que buscamos responder aqui, neste artigo, é:
De quem é o papel de aumentar o volume de diversidade e inclusão no futuro do trabalho?
Arriscamos uma resposta possível. Não é só de uma pessoa. Porém, com uma liderança inclusiva e seus impactos transformadores para os negócios e para a sociedade, somos capazes de imaginar que nada, ou quase nada, será como antes. O grande Q dessa equação está no propósito de se reimaginar o papel das lideranças no meio dos novos comportamentos, das relações redesenhadas e da forma que o mundo do trabalho precisa se adaptar às demandas do mercado de hoje.
37% das pessoas entrevistadas pela Randstad para a pesquisa “Repensando a Ambição” não aceitariam uma vaga de emprego numa organização que não tivesse iniciativas proativas para melhorar sua diversidade e equidade. Outro dado mostra que 74% dos profissionais sentem falta de um ambiente de trabalho mais inclusivo. E por que isso parece importar tanto? Sim, tem algo a ver com o silêncio rosa.
O silêncio rosa
A associação rosa como “cor de menina” e azul, “cor de menino”, nem sempre foi assim. Na verdade, era até o contrário, porque o rosa, uma espécie de vermelho mais diluído, trazia uma ideia de força, de poder. Logo, de masculinidade. Somente após a Segunda Guerra Mundial, quando surge o conceito de igualdade de gênero, que se constrói um novo ideal que limita cores a gêneros e que, desde então, tornou-se um debate barulhento que busca desmistificar esses lugares comuns.
Foi o rosa que ganhou a batalha, no entanto, do imaginário popular e do mercado para falar sobre o poder de consumo da comunidade LGBTQIAPN+. Assim como os termos Green Money (voltado para consumo mais ecológicos e sustentáveis) e Black Money (ressignificado para o apoio a negócios de pessoas negras), o “dinheiro rosa” se popularizou de duas maneiras: de um lado, tratando da comercialização de produtos voltados para esse público e, do outro, questionando marcas e empresas que pautam essas ideias com intenções puramente lucrativas, sem estar atrelado a um discurso alinhado com o propósito.
A redação recomenda
Estamos falando de uma comunidade que representa cerca de 7% do PIB nacional e com R$420 milhões estimados em poder de compra. Segundo dados da Nielsen, o público movimenta cerca de R$11 bilhões por ano em consumo no varejo e no comércio eletrônico, além de gastar 14% a mais do que as demais famílias.
Hora de aumentar o volume
Aqui, fica aquela pergunta: diante de tanto valor, onde estão as ações de Diversidade e Inclusão, as iniciativas de apoio à comunidade LGBTQIAPN+ pelas lideranças quando passa o mês de junho, o mês do Orgulho? Por que essa lógica silenciosa durante a maior parte do ano que se sustenta em falar apenas quando todo mundo está falando, em busca de “sair bem na fita”? O silenciamento não é só para fora. Em boa parte das empresas, os investimentos dessas iniciativas, quando acontecem, concentram-se em épocas específicas e, depois, param. Desliga-se o som.
Entende a importância do volume? Visibilidade. Quando as empresas colocam Diversidade e Inclusão no core business, plantando uma semente de uma cultura de times diversos - com mais e variadas habilidades, experiências, visões de mundo, valores, provenientes de marcadores sociais e outras características -, coloca-se luz no desenvolvimento de negócios inovadores e rentáveis. E não se molda culturas sem o protagonismo da liderança, que precisa valorizar a inclusão, ter empatia, escuta ativa, flexibilidade e antifragilidade.
As 6 características de um líder inclusivo
Os 4 mega desafios do futuro do trabalho apontados por uma pesquisa da Deloitte mergulham num mundo complexo, incerto e, sobretudo, diverso. Para os especialistas, fala-se sobre a diversidade de mercados, consumidores, ideias e talentos, essas quatro dimensões que estão exigindo que se repense o jeito tradicional de trabalhar a figura do líder, do gestor, de forma muito rápida. Eles identificaram assim 6 traços importantes para se prosperar como uma liderança inclusiva e contribuir para a mudança dos negócios nos próximos anos.
- Comprometimento: ser intencional na hora de lidar com diversidade e inclusão no dia a dia é uma jornada. Ou seja, leva tempo, demanda uma dedicação para a aprendizagem e humildade para se colocar no lugar de escuta. Não entender a importância dessa agenda ser uma prioridade para todos os níveis de liderança no negócio é começar num terreno arriscado;
- Coragem: um passo em direção à inclusão precisa colocar todos no mesmo barco e prepará-los para encarar os riscos, desafiando modelos tradicionais de trabalho. Não deve, portanto, parar nas equipes de DEI, na rotina das áreas de RH, de People, mas movimentar outras lideranças, provocar escopos de trabalho a refletir “como posso contribuir com o meu papel para trazer para perto talentos, clientes, fornecedores, stakeholders de forma aliada?”;
- Reconhecimento dos seus vieses inconscientes: seja na vida pessoal ou profissional, ter consciência dos seus vieses é imprescindível para que líderes possam agir sobre eles com novas atitudes, impedindo que tomem decisões baseadas nas “primeiras impressões” ou preconceitos inconscientes;
- Curiosidade: estar aberto a novos e diferentes pontos de vista, alimentando o seu interesse pelo desconhecido, atento a vivências distintas, ajuda a ter uma escuta melhor. Quando um líder abre espaço para ouvir a todos, desde gerente ao estagiário, ele se permite construir grupos mais diversos e serve de exemplo para outros;
- Inteligência cultural: em espaços cada vez mais globais, com novos modelos de trabalho, essa é uma habilidade essencial para atuar de forma colaborativa e se apoiar em diferentes perspectivas e soluções para resolução de problemas;
- Colaboração: aqui, todo mundo importa e tem algo a contribuir com o coletivo com as suas diferenças, seja qual for o seu perfil. Um líder inclusivo é capaz de identificar forças e habilidades a serem desenvolvidas em cada pessoa do seu time, valorizando a experiência coletiva ao criar formas de manter uma comunicação aberta e transparente, confiança mútua e um compromisso compartilhado com os objetivos do grupo.
Atuar de forma mais inclusiva é também demonstrar flexibilidade e adaptabilidade em suas ações e decisões. E, para isso acontecer, é necessário ser uma liderança aberta a diferentes perspectivas (lembra da curiosidade?) e ser capaz de ajustar estratégias quando for preciso, atenta às diversas necessidades da equipe. É reconhecer que cada membro do grupo possui perfis e experiências únicas e valorizar essas diferenças como um recurso importante para atingir os resultados que procura. E quando se trata de pessoas LGBTQIAPN+, essas vivências são potencializadoras de inovação.
O aprendizado é contínuo, pois um verdadeiro líder inclusivo sabe que, muitas vezes, não é sobre saber as respostas para tudo, mas ter as perguntas certas. E aqui, a escuta ativa e a comunicação eficaz, combinadas com empatia, tornam-se chave para construir confiança e criar um senso de pertencimento e de aliança. Tudo isso ajuda para um trabalho mais seguro, harmonioso, produtivo e saudável no dia a dia para todo mundo. Ser inclusivo é perceber o silenciamento e dar voz, um exemplo tão necessário para os dias de hoje. Certo?